Era a mesma sala de espera

Era uma sala de espera como outra qualquer. Lá, eu esperei. Ainda estamos em fevereiro. Eu repetia isso pra mim mesma. A menina não vai aparecer aqui hoje. Aquela da bolsa feia e do cigarro. Ela deve estar curada. Aliás, pode ser que ela nem estava doente. Tenho certeza que era uma visita de rotina. Não que ela combine muito com a noção de rotina, mas tudo bem. Quem sabe ela só passou aqui para ver o médico bonitão. Só digo que ele era bonitão pois o vi antes de ter as minhas pupilas dilatadas. Também porque ele foi super simpático e disse:
- Tenho um caso de toxoplasmose. A moça é muito jovem.
Muito jovem para ter dor nas costas. Muito jovem pra ser atriz. Muito jovem para se apaixonar por alguém e fugir para as Antilhas Francesas. Eu tenho certeza que foi isso que aconteceu com a menina da outra consulta. Eu percebi que ela estava com um sorriso anormal e com olhos de quem está quase chorando. O quase-choro feliz é um fenômeno peculiar.
Se eu tivesse que apostar, diria que esse foi o primeiro sorriso depois dela perceber que se apaixonou por alguém. Não me leve a mal, as pessoas podem ficar felizes por vários motivos e podem se sentir realizadas de diversas formas. Mas como poeta, eu aposto que era amor.
Aposto que era um dos primeiros sorrisos e que ela viu corações nas calçadas enquanto chegava no hospital. Sabe? Bem no começo, quando tudo parece que tem formato de coração? Talvez foi por isso que ela veio se consultar, no fim das contas.
Em um dado momento, eu percebi. Na falta daquela menina, a doida da sala de espera era eu. Eu com o cabelo raspado do lado, não aprovado pela vovó, e meu 2048 como droga. Lembremos que não pega internet na sala de espera ok amigos. Dentre aquelas pessoas, eu era a estranha que cantava em uma língua que ninguém entendia.
ESTRANHO É PENSAR QUE O BAIRRO DAS LARANJEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEIRAS
Mal sabem eles que meu olho de quem está quase chorando era devido ao gel doido que a médica passou. O sorriso era só comemorando a cicatriz mesmo.
E os corações nas calçadas?
Bom, era o meu próprio coração. 
Que menina largou aqui. 
Logo antes de fugir para as Antilhas.

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