Topologia das cartas abertas

Meu amor,

Desde que a frase "je ne supporte pas de t'écrire" me levou a ler cartas eróticas em francês na internet, eu confesso que estou com uma mania incontrolável de cartas de amor. Mas o que são, nos tempos de hoje, cartas de amor, senão um passatempo de quem gosta de escrever? O que elas são, meu amor, senão redundâncias? Seriam elas um jeito de escrever aquilo que não precisa ser escrito? Sempre foram? E são tão ridículas, todas elas. Sempre foram! Tão cheias de promessas e tão cheias de mentiras. Mentiras, mas que escritas com tanta coragem e delicadeza pelo remetente, até parecem verdades. Ou talvez mentiras, que escritas na ausência tão sentida do destinatário, chegam mesmo a virar verdades. Afinal, o que são elas, as cartas de amor, e o que sempre foram, senão uma tentativa de encurtar distâncias? Por mais que eu goste de escrever, meu amor, só o faço neste momento pois estou impossibilitada de te acariciar como gostaria. Na falta, sinto-me obrigada a tentar, ao menos, colocar em palavras aquilo que o meu corpo chora e sangra. Eu te amo tanto que chega a doer. Mas, essa dor, ah, meu amor, eu não desejo nem para o meu pior inimigo a incompletude de morrer sem senti-la. O ar é mais rarefeito para nós, os apaixonados. Ele nos falta de tempos em tempos, naqueles momentos em que a saudade aperta o peito e morremos um pouco, pois a nossa vida se resume a reencontro.
O que são elas, meu amor, as cartas de amor, senão chegadas e partidas? Ainda por cima, as cartas de amor só existem, de fato, quando são abertas. O que são, meu amor, longas cartas de amor, senão vestidos curtos, escolhidos a dedo para serem tirados e jogados no chão do quarto? E isso ainda é só o começo do que eu posso te prometer. Pois o que seriam as cartas de amor, meu amor, se não fossem exageros? Eu te prometo amor eterno e incontrolável. Te prometo a Lua e as estrelas. Te prometo todos os teus sonhos. Com os meus, não te preocupes. Eu costumava pensar que você parecia um sonho, mas agora sei que eram os meus sonhos que sempre se pareceram com você. Tentarei voltar a algum deles, pois, honestamente, não aguento mais te escrever.
Que a leitura faça a carta verdadeira.

Assino com o título que não acho que mereço, mas que gostaria de reivindicar,
Seu amor.

Obrigada, Fernando Pessoa. Je vous remercie beaucoup, Anaïs Nin.

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