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Eu li o seu texto. Você só me perdeu no finalzinho. Não gosto dessa sua mania de colocar destinatário. O texto é para o texto, ué. Recebi os seus cartões, viajei neles. Eu te falei sobre as almas das plantas e suas vontades de sobreviver. Elas sabem que eu faço mudas porque eu sempre aviso pra elas. Mas se as trato na terceira pessoa, os textos não são tanto para elas. Quando escrevo assim, elas são remetentes comigo, se estou sendo bem sincera. Escrevo, de fato, para amantes. Daqueles que se deitam um em cima do outro e ficam ali, pra sempre. São sentidas suas faltas, mas eles se suspendem da correria do tempo, esse teimoso que não dá nem um passinho pra trás. Nem a menor paradinha pra gente respirar ele faz. Então eles perdem compromissos, aniversários, vôos. Vivem poesias sem as escreverem. Não atingem os topos das carreiras, não ganham prêmios. Nem importa. Não assistem aos vídeos do momento, não ficam sabendo das últimas notícias importantes. Deitam-se um em cima do outro e ali ficam, para sempre. É lógico que eventualmente se levantam - a convivência com as plantas lhes dera instintos de sobrevivências altamente aguçados. Comem. Banham-se com prazer. Fazem chá, então, com as folhas que caem na terra e no lençol. Eventualmente leram o que deviam e escreveram o que era preciso e o que não era. Mas voltaram a se deitar, um em cima do outro, sem sair dali nunca mais.
A bruxa me disse que um dia, quando eu estivesse muito inspirada, deixaria que as novas plantas pegassem chuva. E meu mago, quando nos molha, viro ponte.
Quanto mais eu me apaixono por Lucas e Mateus e alguns não evangelistas, mais eu me apaixono por ti; e quanto mais eu amo Clarice e Cecília, mais eu te amo; é verdade. Não que eu desaconselhe a preocupação, é sempre gostoso se sentir joia de preciosa e bela de se mostrar. É assim que eu gosto de escrever. Eu nem preciso pensar, as coisas acontecem. Logo após o trenó do papai Noel, passa o carro da funerária com seus semelhantes e quando eu entro no condomínio, duas meninas com camisetas da Lilica me pedem abraços. É isso que eu tenho. Minha aluna que aprendeu a ler com a luz do lampião vai parir uma menina e dar a ela o meu nome. Te perdi?

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