Minha próxima esposa vai gostar de Leminski
AMOR
Amor, então,
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.
Paulo Leminski
Garçom, por favor, me traz uma cerveja.
Ah, e me vê também um baralho e um parceiro. De preferência
alguém que dance. Que me desculpem os ex maridos que não dançam, mas eu não
quero passar o resto da vida levando o meu irmão nas festas para dançar comigo.
Acho que foi essa a razão do divórcio. Mentira, amigo, traz mais uma cerveja
que eu te conto tudo. Ela não gostava de Jack White, então posso dizer que foi
incompatibilidade musical. Mentira, na verdade ela gostava mas eu é que prefiro
música ruim mesmo. Mentira, na verdade foi porque ela gostava de gatos. Você sabe,
garçom, que eu sou uma dog person. Na verdade foi porque a minha mãe
não foi muito com a cara dela. Ou foi o meu irmão, aquele que vai dançar comigo até eu casar de novo. Ou talvez foi porque ela dormia com pouca
coberta e eu sou friorenta. Não te convenci? Então senta aqui que eu vou
te contar as séries que ela assistia. Garçom, aqui nessa mesa de bar, você já
cansou de escutar centenas de casos de amor. Tanto os do Reginaldo Rossi quanto os meus. Sim, porque eu repito várias vezes
a mesma história pra tentar ver a razão nos meus atos. Talvez a gente
se divorciou para que ela pudesse ser um amor do passado. E antes de me
criticar, deixa eu refletir sobre como esse amor é bonito. É o tipo de amor que a gente esquece dos problemas e só lembra dos poemas. Já dizia Leminski, que amor não acaba, mas se transforma numa matéria-prima, que a
vida se encarrega de transformar em raiva. Ou em rima. Acho que foi
justamente essa esposa que me passou esse poema. Acha aí um guardanapo que eu
anoto pra você. Ou então anoto aqui nesse quatro de mole. Quem diria, hein. Uma carta com um poema, vai ser a mais forte do baralho. Acho que tem uma palavra
em japonês pra isso, de quando a carta mais fraca vira a mais forte. Tu acha
que é facão? Então pede truco nesse fim de outubro. Outubro ou truco. Ou seis. Então
você lembra do dia do meu aniversário? Talvez a gente possa casar. Você dança? Em vez de
te dar casa, comida e roupa lavada, eu te dou, te caso, te como e te lavo. Que coisa mais feia pra se dizer numa mesa de bar. Traz a saidera que já tá na minha hora de voltar pra casa.
Quanto foi tudo? Dá pra fazer no crédito? Imagino que final de
mês seja complicado pra quem vive de comércio.
Ainda bem que eu vivo de amor.
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