Limparam os corações pichados no ponto de ônibus

Limparam os corações pichados no ponto de ônibus e assim acabaram várias das minhas paixões platônicas. Tantos casamentos que terminaram em divórcio ou anulação antes mesmo de serem realizados. Morreram tantos filhos que eu nem tive. As casas foram vendidas. Os cachorros foram doados. Esse emprego que arranjei do outro lado do mundo só pra ficar do teu lado, vou largar. A lua-de-mel foi cancelada, uma pena, pois acho que nossas fotos teriam ficado lindas. Ah, paixões de transporte coletivo. Aquela menina, no metrô, estava com o olhar tão triste. Não quer dividir essa tristeza comigo? Serviria de ombro amigo. Antes, quando havia corações pichados no ponto de ônibus. Agora sou frio. Ah, paixões platônicas. A menina da sala de espera. Como que ela era capaz de ser tão linda? Hoje, já não me encanta. A moça que faz vídeos pro youtube, com covers de músicas que eu gosto. Por que ela parou? Hoje, isso nem importa. Alguém que eu conheci em alguma viagem. Em alguma esquina da vida. Hoje, prefiro não imaginar o nosso futuro. Limparam os corações pichados no ponto de ônibus e assim acabaram várias das minhas paixões platônicas.
Separações tempestuosas. Filhos desparidos. Cachorros doados. E minha mãe, que esqueceu seu nome antes mesmo de ficar sabendo qual era.

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Um menino ligou para alguém e avisou que a polícia estava indo pra lá.
Ele foi minha primeira paixão platônica depois do acidente com os corações.
Ele tirou uma foto, enviou para alguém. Tentou disfarçar, mas eu vi que tinha um sorriso escondido ali. Quem sabe era um romântico, assim como eu.
Na hora de pagar o ônibus, não foi possível esconder que as minhas mãos estavam sujas de tinta vermelha.
Alguém tinha que pintar os corações de volta, não é mesmo?

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